segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Untitled.




E de tanto fugir, acabei me (des)encontrando.


Quis ficar calada e falei tudo o que não era preciso.


Encontrei pessoas boas e más; fiquei com um pouco de cada uma delas.


Perdi atenção, perdi companhias, mas pedi amor (e aí, perdi a cabeça!).


Ganhei coisas boas e recusei a maioria.


Construí um castelo intransponível de cartas, em que a única dama sou eu.


-- E foi na fragilidade que busquei meu escudo.


Quanto mais faço o melhor, mais perco um pedaço de mim.


Sou a peça imperfeita que, imperfeita sendo, quer fazer o que nunca conseguiu.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Sentidos


Todo dia paro. Penso... Paro. Reparo. Repenso.

No que foi dito. No que foi feito e no que ainda será... Refeito. Redito. Retido.

Em marcas não-visíveis. Irrepetidas.

Marcas de agora. Sem cicatriz. Sem poesia.

Resultado da expectativa da própria ilusão. Uma nova ilusão, apenas.

Construção frágil. Irreal. Hiperbólica.

Que, no meu emaranhado de descontinuidades, desenha a minha angústia, minha alegria incompleta, meus (re)sentimentos.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

62ª memória


(...) Todas as noites, antes do sono, baixava em mim uma obsessão linda: — “Hollywood vai me descobrir”.
Eu, na Broadway, eu, em Tóquio. Lembro-me de que, certa vez, fui, à tarde, ao Teatro Municipal, fazer não sei o quê. Parei um momento no palco imenso e vazio. E, de repente, uma tensão dionisíaca inundou o teatro deserto. No alto, a cúpula estava ressoante das palmas espectrais. O lustre apagado ardia em cintilações frenéticas. Ouvi de novo a voz de José César Borba chamando: — “O autor!”. Saí do teatro, febril de glória.
Mas não conseguia fazer a minha segunda peça. Comecei e recomecei umas cinqüenta vezes. E não escrevia sem pensar nos meus admiradores. Eis o que me perguntava: — “O que dirá o Álvaro Lins? E o Manuel Bandeira? E o Pompeu? O César Borba? E o Drummond?”. Um belo dia, descobri que todos os citados, e mais outros, e outros, seriam meus co-autores fatais. Eu era um território ocupado pelos bandeiras, álvaros, pompeus, borbas, prudentes. Cada admiração me comprometia ao infinito.
O heróico da minha descoberta é que o elogio não perdera, para mim, a sua graça plena. Ver o meu nome no jornal ainda me fascinava. Mas e eu? E eu? Eis a verdade que, em tempo, percebi: — o elogio era uma falsa e perversa delícia. (...)

Nelson Rodrigues, 1967.